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A nova farda do Bope

Written By Novinhas Gulosas on sábado, 12 de outubro de 2013 | 22:28

 


“Tira essa roupa preta! Tira essa roupa preta, que você não merece usar! Você não é ‘caveira’, você é moleque!” A sequência célebre do filme Tropa de elite, em que o capitão Nascimento (Wagner Moura) repreende o erro do aspirante Neto (Caio Junqueira), provavelmente perderia a força se os “homens de preto” do Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) vestissem outra cor. 

A roupa escura, ao lado da caveira, é símbolo da mística e da identidade da unidade policial mais famosa do país. Mas a farda celebrizada pelo Bope põe em risco a vida e a saúde dos seus 440 integrantes, segundo estudo da Polícia Militar. 

O preto se destaca em terrenos diversos, expondo o policial e dificultando a camuflagem nas operações. Também acumula calor, provocando desidratação dos soldados. Por isso, a partir do início de 2014, a tropa de elite do Rio vai trocar o famoso uniforme preto por um camuflado digitalizado – um tecido resistente, com a estampa de pequenos quadrados confeccionada por computador, onde o verde se sobrepõe ao marrom e ao preto.

A PM chegou a anunciar a nova farda em 2012, mas os recursos não foram liberados na ocasião e, contra a vontade dos comandantes dos “caveiras”, a ideia continuou na gaveta. Agora, o Estado-Maior da Polícia Militar já autorizou a compra, empenhou o dinheiro, e a encomenda foi feita. Em três meses devem chegar ao batalhão as primeiras 930 fardas em modelo “floresta”, semelhante ao usado pelos fuzileiros navais dos Estados Unidos, ao custo de R$ 283.600 – R$ 305 por conjunto de gandola (camisa militar) e calças.

Segundo o Bope, o uniforme verde permite camuflagem muito mais eficiente em operações na mata e áreas urbanas, como as favelas do Rio, ambientes operacionais da unidade. “A cor preta contrasta-se facilmente com qualquer cor à exceção dela mesma. 

O policial fardado de preto pode ser plotado [localizado] à distância, tornando-se um alvo fácil no ambiente operacional”, afirmou o tenente-coronel Fábio Souza, atual comandante do Bope, em estudo técnico de 2009 que embasou a decisão.

O tradicional preto ficará restrito a ações do Grupo de Resgate e Retomada (GRR), e eventuais operações noturnas. Segundo a doutrina das operações especiais, o emprego da cor negra tem efeito psicológico sobre o inimigo em alguns tipos de ação, como invasões táticas, resgate de reféns ou ação antiterror. Nesses casos, um policial todo de preto e mascarado provocaria no opositor a ideia de um ser sobre-humano, invencível. Para as operações diurnas, porém, passará a ser adotada a farda verde.

Migração de traficantes para matas acelerou mudança

Outra razão conjuntural do Rio apressou a mudança de uniforme. Com o avanço progressivo das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), a PM tem observado uma migração de traficantes remanescentes de favelas ocupadas para áreas de florestas. Criminosos que invadem comunidades de grupos rivais também optam por se instalar provisoriamente na mata próxima, no primeiro momento, até estabelecerem relações mais amistosas com a população. No fim de setembro, após identificar um acampamento de 20 barracas com gerador de energia na mata que circunda o Complexo do Lins, na Zona Norte do Rio, o Bope montou uma operação para prender o grupo de 40 homens. Na troca de tiros dos homens de preto com traficantes, o subtenente Marco Antônio Gripp, de 47 anos, foi morto, e dois outros “caveiras” ficaram feridos – ao menos um criminoso morreu.

“A dinâmica do tráfico se modificou, e a mudança do uniforme é uma das maneiras de minimizar esse fator”, disse o subcomandante administrativo do Bope, major Maurílio Nunes. A alteração do uniforme também virá acompanhada de maior ênfase no treinamento da unidade em operações na mata e em áreas rurais.

Farda do Bope já foi azul marinho

A mudança não é inédita. Nem sempre o Bope usou preto: seu uniforme era azul marinho até 1992, quando se adotou a cor preta, inspirada no SAS (Special Air Service), tropa de elite do Exército Britânico. Apesar da fama, até hoje essa farda não faz parte do regulamento de uniformes oficiais da PM do Rio.

Curiosamente, foi um estudo técnico de 2009 do então major Fábio Souza, hoje comandante do Bope, para o Curso Superior de Polícia Militar, o primeiro a apontar objetivamente que esse camuflado era superior ao preto tradicional. No trabalho Desempenho operacional do uniforme de combate digitalizado nas áreas de risco do Rio de Janeiro, Fábio usou os PMs do batalhão em experiências práticas com os diferentes uniformes no terreno. 


Os testes de observação de atiradores mostraram que deslocamentos com o camuflado digitalizado retardam a visualização à distância, tanto a olho nu quanto com o auxílio de lunetas, em mata ou favela – o que proporciona maior proteção aos policiais de tiros. Testes de computador também apontaram que identificar o preto levava metade do tempo.

O estudo mostrou ainda que as camisas e calças pretas, sob o sol do Rio e aliados ao peso do equipamento, absorvem grande quantidade de calor e provocam desidratação e internação (elevação da temperatura do corpo por calor excessivo), podendo causar mal-estar. Muitos “caveiras” já sentiram na pele ou presenciaram desmaios de companheiros. O material escolhido para o novo uniforme, moderna mistura de nylon com algodão, permite passagem de ar, menor acúmulo de calor e tem resistência ao fogo.

No médio prazo, os acessórios operacionais dos soldados do Bope – coletes táticos e balísticos, joelheiras, coldre e coturnos – também serão adequados ao padrão verde ou bege. Até os 600 novos fuzis AR-10 previstos para serem comprados deverão ter coronha, punhos e outras partes verdes.

“A utilização do uniforme de combate digitalizado em operações policiais diurnas é a opção mais recomendável para o ambiente operacional no Rio de Janeiro, em comparação ao uniforme preto. Os resultados [dos testes] demonstraram que o uniforme preto é totalmente divorciado do contexto operacional a que está submetido. O uniforme de combate digitalizado atendeu totalmente as expectativas operacionais”, escreveu Fábio.

No comando do batalhão desde agosto, o tenente-coronel vai pôr a teoria em prática e tentar provar que a mística e a imagem do Bope não dependem da roupa preta.


Policial do Bope com um modelo de farda camuflada (Foto: Stefano Martini/ÉPOCA)

Policial do Bope com um modelo de farda camuflada (Foto: Stefano Martini/ÉPOCA)
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